terça-feira, 20 de julho de 2010

Teatro e Ideologia


"Eu vivo num tempo de guerra. Eu vivo num tempo sem sol. Só quem não sabe das coisas é um homem capaz de rir. Ah, triste tempo presente, em que falar de amor e flor é esquecer que tanta gente tá sofrendo tanta dor. Todo mundo me diz que eu devo comer e beber. Mas como é que eu posso comer, como é que eu posso beber, se eu sei que eu tô tirando o que eu vou comer e beber de um irmão que tá com fome, de um irmão que tá com sede? De um irmão... Mas mesmo assim eu como e bebo. Mas mesmo assim, essa é a verdade. 
Dizem crenças antigas, que viver não é lutar. Que sábio é o que consegue ao mal com o bem pagar. Quem esquece a própria vontade. Quem aceita não ter seu desejo é tido por todos um sábio. É isso que eu sempre vejo. É a isso que eu digo NÃO!" 

Dizia este texto no Espetáculo Arena Conta Zumbi. Ideologicamente, é o espetáculo que mais mexeu comigo. Aquele que mais disse coisas significativas. Muito do que aprendi com esta montagem, tento trazer para o meu dia-dia. Esta minha mania dizer o que penso (às vezes com jeito, mas dizer) vem daquilo que aprendi com um professor que tive, que foi também o diretor desta peça. Ele dizia: "O ator é um formador de opinião. Suas opiniões precisam ser claras". Muita gente o criticava por muitas coisas (algumas até com razão), uma delas era que ele fazia um teatro político. Um dia ele rebateu com a seguinte pergunta: "Existe teatro que não seja político? Existe postura humana que não seja política?" 

Até então eu fazia teatro, mas não tinha qualquer ideal ao fazê-lo. Talvez até o tinha, porque meu teatro sempre esteve atrelado à educação. Mas o fato é que não sabia o motivo de eu fazer teatro. Até eu poder aprender um pouquinho mais sobre aquilo. Aprendi um pouco e hoje aquela idéia é muito forte na minha cabeça. Faço teatro para que o mundo seja um lugar melhor. Para que as pessoas sejam melhores. E levo isso muito a sério. Só eu sei. Desde que eu me formei e até antes disso, não houve um sequer espetáculo que montei que não estivesse profundamente ligado a este ideal. Quando a gente acredita de verdade numa coisa, lutamos por ela com unhas e dentes. E assim tem sido. Tenho lutado pelo teatro em que acredito. E lutado muito. E descobri que lutar pelo que se acredita não é fácil. Mais que isso, é doloroso porque para isso é preciso dizer o que pensa e, consequentemente fazer inimizades e até mesmo ganhar alguns inimigos. É duro, mas acredito. E se acredito sigo lutando, pois só assim tenho razão de ser. 

"Eu vivi na cidade do tempo da desordem. Vivi no meio da gente minha no tempo da revolta. Assim passei os tempos que me deram pra viver. Eu me levantei com a minha gente. Posso ter tido erro. Mas não foi erro ter esse desejo doído de liberdade. Eu comi a minha comida no meio da batalha, amei sem ter cuidado, olhei tudo o que via sem nem tempo de bem ver. Assim passei os tempos que me deram pra viver. A voz da minha gente se levantou e a minha voz junto com a dela. Minha voz não pode muito, mas gritar eu bem gritei. Eu tenho certeza que os dono dessas terra e cesmaria ficaria mais contente se não ouvisse a minha voz. Assim passei os tempo que me deram pra viver. Por querer Liberdade. 

TANTO CANSOU
E ENTENDEU QUE LUTAR AFINAL
É UM MODO DE SER
É UM MODO DE TER RAZÃO DE SER. 

O AÇOITE BATEU
O AÇOITE ENSINOU
BATEU TANTAS VEZES 
QUE A GENTE CANSOU..."

Transferi este texto do meu blog pessoal. Acho oportuno fomentar esta discussão sobre teatro e ideologia. 

3 comentários:

  1. Que fique bem claro que essa é uma opinião pessoal do Varlei. E eu divido de muitas dessas idéias com ele, até por isso entrei e faço parte do Casimiro, que é uma associação para unir a TODOS. A parte que eu discordo é da parte de fazer inimizades ou inimigos. Faz quem quer (e eu até tenho, pessoalmente, e sei que poderia ter evitado rss), a questão é entender e aceitar o novo, o diferente e mesmo aqueles que de repente não dividem da mesma opinião ou fazem arte, comida, pé, mão ou jogam peteca pelo simples prazer de fazer, sem uma opinião formada. Ainda sou um pouco "virgem" para entrar nessa discussão, mas quando eu ver que não é possível incluir todos os estilos, ritmos, pessoas, amigos e inimigos na mesma sala e discutir um bem maior, eu deixarei de ser quem eu sou. Minha posição política é essa e é por isso que eu acredito na proposta e no potencial do Casimiro.

    ResponderExcluir
  2. O Fabiano tem razão. É uma opinião pessoal minha. E exatamente por isso optei por fazer a postagem a partir do meu perfil pessoal.

    Ocorre que muitas vezes, a partir do momento que se assumem algumas posturas, inevitavelmente algumas pessoas vão concordar e discordar. Muitas vezes, aqueles que discordam acabam levando o problema para o campo pessoal e é aí que se formam algumas inimizades. Lembrando que discordar não é odiar. Mas infelizmente alguns pensam assim.

    Aceitar o novo é muito difícil para todos, principalmente para aqueles que já estão numa posição confortável. Por isso, muitas vezes acabem deixando de lado os ditos "novos", ou até mesmo os desmerecendo. Isso ao meu ver é inaceitável e quando isso acorre, meu posicionamento é sempre contrário.

    Minhas opiniões são advindas das experiências, muitas delas negativas, que tive. Não posso nem quero obrigar ninguém a partilhar delas. Mas eu sei por que cheguei a estas conclusões. Eu definitivamente não nasci com elas e se hoje tenho uma postura mais firme ou radical, é porque vivenciei coisas que me obrigaram a optar por ela.

    Uma vez ouvi de um amigo de um determinado grupo dizer que nós só seremos reconhecidos e respeitados a partir do momento que começarmos a causar alguns estragos. Enquanto apanharmos e ficarmos calados, não notarão nossa presença e seremos indiferentes. Não que sejam indiferentes ao trabalho que eu executo, seja ele bom ou ruim. As críticas, se forem construtivas, e até as destrutivas, às vezes, me farão crescer como pessoa e como profissional.

    Sigamos na discussão!

    ResponderExcluir
  3. Ao ler esse post do Varlei me veio a cabeça o filme Edukators, para ser mais direto, a frase final do filme. "Todo coração jovem tem uma célula revolucionaria". Acredito que uma das capacidades da arte no geral é reavivar isso em qualquer ser, partindo do ponto de como ele é atingido.
    E ele só pode ser atigindo dessa forma, ou de qualquer outra, a partir do momento em que o artista tenha essa inquietação dentro de si, pois ambos, artista ou público - ou se não quiser essa dissociação tudo bem - são humanos.

    ResponderExcluir